sábado, 30 de julho de 2011

Aroldo Barros e As Trilhas Sonoras da Televisão

Os magos do video e do audio globais juntos: Hans Donner e Aroldo Barros

As Trilhas Sonoras da Televisão

                                      Por: Hugo Kochenborger da Rosa

                                                                                  

Sabe aquela música inesquecível que embala seu personagem favorito nas novelas? Aquele efeito sonoro (ou trilha incidental) que remete ao suspense, ao humor ou ao amor que aparece num determinado momento??  É responsabilidade de Aroldo Barros, sonoplasta da Rede Globo. Tudo feito com muito carinho e com a habilidade cirúrgica que apenas quem tem mais de 31 anos de experiência só em televisão poderia fazer. Mas essa história teve inicio bem antes, ainda na primeira metade dos anos 60, quando Aroldo começa a trabalhar em rádio.  Confira agora um bate papo exclusivo com Aroldo Barros, para conhecer um pouco mais sobre esse personagem que mesmo atuando por trás das câmeras tem tanta ou mais importância do que aqueles que aparecem na telinha.

Hugo - Aroldo, quando você iniciou suas atividades no campo da sonoplastia e como foi sua trajetória dentro do Rádio?

Aroldo Barros (AB) - Sempre fui fissurado por ouvir Rádio AM, na época nem tinha FM. Estava desempregado e ouvindo rádio como sempre gostei de fazer, quando ouvi um anuncio que dizia:
"PRECISA-SE DE OPERADOR, TRATAR NA RÁDIO TERESÓPOLIS". Sem sequer saber do que se tratava, mas precisando muito trabalhar; fui até lá  conferir e tive uma oportunidade. Depois de ficar olhando durante 19 dias, pude pela primeira vez mexer naqueles botões (que, diga-se de passagem, nem eram muitos) e assim descobri que era aquilo que eu queria fazer na minha vida. Isso em 1964.  Foi amor a primeira vista. Trabalhei na rádio Teresópolis, por dez anos quando, também por um acaso, vim parar na Rádio Tupi AM do RJ, acompanhando um colega que veio fazer um teste de locutor e acabei conseguindo um estágio. Fui contratado e lá fiquei de 1973 até 1980 quando vim para a TV Globo trazido por um grande amigo que infelizmente já não está mais entre nós, o  sonoplasta. Paulo Ribeiro.

Aroldo Barros no inicio de carreira na rádio Teresópolis (anos 60)
Trabalhando na Rádio Tupi, atuei paralelamente na Rádio Nacional do RJ, de 1976 a 1985; quando tive que sair por incompatibilidade de horários com a TV. Na Rádio Nacional, tive a alegria de conviver com grandes nomes da época., com quem aprendi muito. Pedindo perdão por não citar todos, gostaria de citar o saudoso César de Alencar, verdadeiro ícone da história do rádio brasileiro; com quem convivi de perto e me tornei grande amigo.
Foi na rádio Nacional que também tive a grande oportunidade quando fazia o Programa da Cidinha. Roberto Rosenberg, que era sonoplasta aqui na Globo, foi ser diretor artístico da rádio juntamente com Paulo Ribeiro e José Sobral. Foi aí que o Rosenberg me conheceu, e vendo o  meu empenho no Programa da Cidinha, conseguiu em Brasília a minha promoção de operador de áudio para sonoplasta. Promoção esta assinada pelo grande apresentador de televisão. J. Silvestre, que na época exercia o cargo de Presidente da Radiobrás.
Retornando ao assunto da rádio Tupi:  Meus primeiros quatro anos na emissora da rua do Livramento 189, 8º andar foram na madrugada, quando tive a oportunidade de aprender muito fazendo programas como: “Carlinhos de Azevedo Show”. “Collid Disco” (com Collid Filho). e o “Show da Madrugada” apresentado pelo meu grande amigo. Washington Rodrigues (O Apolinho). Atuei também em “A Turma da Maré Mansa”. Uma espécie de “Zorra Total” no rádio, com apresentação do saudoso Antonio Luiz.
Depois disso, passei a trabalhar durante o dia, quando tive a grata satisfação de fazer programas como: “Antonio de Almeida Show”, “Show do Paulo Lopes” e “Cidinha Livre”. Este último apresentado pela minha querida Cidinha Campos. Na verdade comecei fazendo o programa da Cidinha na Rádio Nacional e com a ida dela pra Tupi, meu horário foi invertido e eu continuei com ela até vir para a TV.
Diga-se de passagem foi através do programa dela que o Paulo Ribeiro me conheceu e acabou me trazendo pra cá (Globo). Gostaria de lembrar que nesse período em que trabalhei na Tupi e Nacional, trabalhei paralelamente por um bom período na Rádio Fluminense AM. em Niterói e na extinta TV Rio.

Um dos equipamentos utilizados por Aroldo  na sonorização (anos 80)
Hugo -  Detalhe para a gente como era o processo de sonorização de uma telenovela por exemplo no princípio dos anos 80, e de que forma esse processo evoluiu até chegar nos dias de hoje? O advento da edição não-linear facilitou seu trabalho?

AB - Quando vim para a Tv Globo, no dia 02/06/1980, a sonorização era feita na base da fita e do vinil., o que pra mim foi ótimo, pois como eu já trabalhava com isso na Rádio, não mudava muita coisa. A não ser pelo fato de  que lá eu não tinha imagem.
Logo depois começaram os boatos de que em breve chegaria na sonorização um “tal”  de “SYNCLAVIER”. Na verdade ele nunca veio e continuavamos sonorizando com fitas, discos, e editando na gillette.
Acredito que por volta do ano de 1986 ou 87 se não me falha a memória, chegava pra gente trabalhar. O “AUDIO FRAME”. Começava aí o nosso martírio. Afinal, depois de usar tanta fita, vinil e até acetato, tendo que editar na gillette,  aquela “coisa” parecia que ia morder.
Depois do “AUDIO FRAME”, veio o “SONIC SOLUTIONS”.  Todos descartáveis. Finalmente chegou o “PRO TOOLS”. Esse sim, veio pra ficar.
Hoje as coisas são muito mais fáceis, pois o computador faz tudo pra gente.
Não esquecendo que a máquina é “fria”. A sensibilidade tem que estar no sangue, pois é um dom de Deus e não pode ser ensinada em nenhuma faculdade.  

Hugo - Quais foram os primeiros trabalhos que contaram com sua habilidade profissional na parte de sonoplastia?

AB - Comecei na TV, ainda antes de me tornar funcionário, colaborando na trilha internacional da novela “DANCIN DAYS” (1978).
Hoje existe toda uma estrutura para isso através do departamento internacional, que cuida dessa parte. Mas naquela época era feito no CPP, junto com a sonorização.
Depois sonorizei programas como “Os Trapalhões” e muitos outros da época.
Um dia fui escalado para fazer a minha primeira novela das seis, substituindo a Jenny Tusz que estava indo para o Horário das 19h.  Portanto “O Homem Proibido”.(1982), foi a primeira novela que tive o prazer de sonorizar. Depois vieram outras do horário das seis, depois das sete e então as das oito, que foram nada mais,  nada menos do que 23. Só do horário nobre!


Hugo -  Quanto tempo você demora em média na sonorização de cada capítulo de novela?  Nesta fase existe alguma interferência do diretor da trama, ou o seu trabalho é independente?

AB - Depende muito de cada capitulo. Tem uns que demoram mais e outros que demoram menos. Normalmente se sonoriza um capítulo em dez ou onze horas.
Quando se trabalha em equipe, sempre tem interferência de outras pessoas, incluindo o diretor. Afinal quando um capítulo vai ao ar, a maioria dos telespectadores nem imaginam quantas pessoas estiveram envolvidas para que aquele trabalho fosse concluído.

Hugo - Quem seleciona as músicas que farão parte de uma trilha sonora de novela?  A própria TV Globo, ou existe algum tipo de acordo operacional onde as gravadoras também opinam nesta escolha?

AB - Esse processo de seleção acontece de comum acordo entre a direção da novela, os autores e a direção musical na pessoa do Mariozinho Rocha.

Mariozinho Rocha
Hugo -  E quanto a execução maior ou menor de um determinado tema na trilha de uma novela, que fatores são levados em conta?

AB - Para isso não tem uma determinação específica. Vai depender do decorrer da trama. Às vezes uma música que faz parte da trilha, é muito pouco executada por falta de oportunidade, pois muitas das vezes o personagem que tem uma determinada  música como tema acaba não acontecendo, e aí não se tem situação favorável  para sua execução.
 
Hugo -  Quais foram as novelas que mais marcaram sua carreira na questão da sonorização e qual tema de novela você elegeria como seu favorito de todos os tempos?

AB - Poderia citar muitas aqui, já que como falei anteriormente; só no horário das oito, foram 23 novelas sonorizadas. Mas com certeza entre os muitos campeões de audiência que tive a honra de sonorizar,  “Roque Santeiro” é disparada a que mais marcou a minha carreira dentro da TV Globo.
Quanto ao tema preferido é melhor nem citar (risos),  pois num total de 35 novelas e algumas mini-series , imagina quantas músicas eu ajudei a transformar em grandes sucessos. Fica muito difícil eleger uma favorita.
  
Hugo - Sabemos que você recebeu ao longo de sua carreira diversos elogios, não só por parte dos telespectadores, como da imprensa e também por parte dos próprios autores e diretores das inúmeras telenovelas que contaram com seu trabalho de sonorização. Você citaria algum momento desses em  especial, onde foi tomado de surpresa e emoção dentro desses diversos elogios?
  
AB - Fica muito difícil falar de elogios. O que posso dizer é que sempre fiz o meu trabalho com o maior apreço e carinho,  pois sou completamente apaixonado pelo que faço. Assim, sei que acertei muitas vezes.   Mas também errei bastante. Só que todas as vezes que errei, com certeza foi tentando acertar.
Com relação à paixão que tenho pela minha profissão costumo usar uma frase do Comandante Rolim (ex presidente da TAM).
“A MELHOR COISA DO MUNDO É FAZER O QUE A GENTE GOSTA, POIS QUANDO FAZEMOS O QUE GOSTAMOS, NÃO PRECISAMOS TRABALHAR”. Assim, posso dizer que nunca Trabalhei! (risos)


Matéria do Video Show com Aroldo Barros

Hugo -  Como era a figura do Dr. Roberto Marinho com seus funcionários?

 AB - Sempre digo que Dr. Roberto era o avô dos meus filhos, pois era um verdadeiro pai para mim. Acho que isso eu posso falar em nome de todos os funcionários da TV Globo que tiveram a alegria de conviver de forma próxima com ele.

Jornalista Roberto Marinho
Hugo -  Você assistiu seu trabalho nos reprises de “Vale Tudo” pelo Canal Viva? E por falar nisso, você sofreu algum tipo de pressão nem que seja pela sua própria família para antecipar “quem teria sido o assassino de Odete Roitman”, quando da exibição original da telenovela em 1988?

AB - Assistia sempre que possível a “Vale Tudo” e ainda assisto ao “O Rei do Gado”. É muito bom recordar aqueles tempos dourados. 
Quanto à pressão. Era da família, dos vizinhos, do cachorro e do papagaio (risos)... Todo mundo queria saber. “QUEM MATOU ODETE ROITMAN”. Evidentemente, que por questão até de ética profissional, eu não poderia antecipar.

Novela Vale tudo (1988)

Hugo -  Sabemos que “Roque Santeiro” também contou com seu talento de sonoplasta, sendo que esta novela está novamente no ar no Canal Viva.  O que você falaria sobre esse trabalho?

AB - Sou muito grato a Deus por ter me dado a oportunidade de dar a minha humilde colaboração no sentido de poder ajudar a escrever um pouquinho da história da TV brasileira, sonorizando grandes novelas como: “Pedra Sobre Pedra”, “Fera Ferida”, “Vale Tudo”, “Renascer”, “Tieta”, “Esperança”, “O Rei do Gado”, e muitas outras de muito sucesso.
Mas cá pra nós,  acho que se eu não tivesse feito mais nada na TV Globo, “Roque Santeiro” já seria o bastante.  
Novela Roque Santeiro  (1985)
                                
Hugo - E atualmente, você está sonorizando alguma telenovela? Qual?

AB - Eu estava escalado para fazer a nova novela das onze “O Astro”, mas através de um acordo feito pela direção, acabei ficando no “Video Show”. Adoraria fazer a novela, que com certeza será um grande sucesso nesse novo horário, mas estou extremamente feliz e realizado fazendo o “Vídeo Show”.  Estou simplesmente AMANDO fazer esse Programa!

Aroldo Barros sonorizando o Video Show


Diretor Jorge Fernando e Aroldo Barros



* Circulou  no caderno de cultura "Blitz" da rede de radios e jornais Diário da Manhã, encartado em comum  nos jornais de Passo Fundo, Carazinho e Erechim (RS), em 15.07.2011
* Circulou de modo compactado no Jornal do Long Play, editado mensalmente  pela Academia Vilhenense de Letras (Vilhena RO) na edição de  07.2011
*Todos os direitos reservados pelo autor. Proibida a reprodução total ou parcial deste artigo, sem prévia autorização do titular.